quarta-feira, 18 de março de 2009

Qual é o problema de viver numa ilusão?

Miguel Antunes

Uma das questões que se colocam no filme Matrix é a de saber porque é que é melhor saber a verdade sobre a matrix e portanto conhecer a realidade adversa ou, por outro lado, manter-se na ilusão, na matrix conformado e tranquilo.
O filme sugere inúmeros problemas filosóficos passíveis de debate. Problemas estes já abordados de alguma forma por vários autores ao longo da história da filosofia e outros que se nos colocam contemporaneamente de forma nova.
Este problema mencionado no início, a saber, se é preferível a verdade ou a ilusão, pode ser identificado com um tema clássico da Filosofia Política que se pergunta se faz sentido a ideologia política vigente e os valores vigentes ou se será melhor a libertação de uma ideologia propagandística mediante a mudança de paradigma, isto é, mediante a revolução.
Sem querer antecipar o debate que será realizado, pode-se dar atenção a um ou dois aspectos deste problema. Por exemplo, pode-se pôr em questão porque é que na tradição cultural ocidental é moralmente reprovável escolher a ilusão em vez da verdade. Porque é que, apresentado de outra forma, é imoral aceitar uma utopia que mistifica um povo, uma ditadura de direita ou de esquerda como se constituíram no passado?
Colocando a pergunta de uma forma mais contemporânea seria o equivalente a perguntar porque é que é imoral aceitar a ilusão do Eldorado e da riqueza que a ideologia capitalista liberal propõe.
Contudo, estas perguntas às quais imediatamente acedemos com uma resposta mais ou menos emocional, mais ou menos pensada e fundamentada, tapam por sua vez outras perguntas de base sem as quais não se pode responder com real importância se não se lhes der atenção. Ou seja, temos de recuar ou descer um patamar aos fundamentos do que está em questão para podermos ter uma conversa sobre isso que valha a pena.
Por exemplo, quando nos perguntamos porque é que a verdade é melhor que a ilusão de um ponto de vista moral temos de ter clarificado anteriormente o que é uma moral, qual é a nossa moral e que justificação (ética ou filosófica) temos para defender esta moral em vez de outra ou de nenhuma.
Outra pergunta de base que se deve colocar quando se pergunta porque é que moralmente a verdade é preferível à ilusão é: afinal o que entendemos por verdade ou o que é para nós a realidade e como podemos provar isso.
Por fim, e a título de exemplo, duas últimas perguntas que subjazem a esta pergunta (porque é que moralmente é preferível a realidade ou a verdade em vez da ilusão) – se procurar a verdade implica cortar com a ilusão presente, e portanto fazer uma revolução material, ideológica e/ou política, como podemos provar que a revolução trará uma mudança ou apenas uma outra ilusão?
E, por fim, como podemos provar ou saber se mais alguém, além de nós próprios, quer a revolução, ou que direito temos de forçar os outros a aceitar aquilo que tomamos pela realidade?
Estas são apenas algumas propostas de debate que este tema e este filme rico em dúvidas e ideias promove. Gostaria de convidar todos os interessados a duvidarem e a participarem nos debates que se realizarão nos próximos dias neste âmbito.

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